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Como foi o 25 de Abril na Casa da Achada

Foi no final de tarde de 25 de Abril que inaugurou a nova exposição da Casa da Achada – Centro Mário Dionísio: ‹‹Mário Dionísio – Vida e Obra››.

Cartaz expo MD

Pouco faltava para as 19h e abriram-se as portas da zona pública da Casa da Achada. Já muita gente esperava na rua para poder ver a exposição, pessoas que vieram do desfile da Avenida da Liberdade, pessoas que souberam da inauguração pelos jornais ou pela nossa página, pessoas que vieram conhecer um pouco mais da vida e da obra de Mário Dionísio, conversar com outros e ouvir o Coro da Achada.

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Enquanto ainda chegava gente, o Coro da Achada começou a actuação no Largo da Achada – onde cantou várias canções com letras de poemas de Mário Dionísio: ‹‹Que tu es fort››, ‹‹Pior que não cantar››, ‹‹Limões››, para além de outras -, seguindo depois para o terreno em frente à Casa onde se cantou ‹‹La bande à Riquiqui›› e ‹‹A Semana Sangrenta›› (ambas da Comuna de Paris) e poemas de José Gomes Ferreira (‹‹Dulcineia››), Carlos de Oliveira (‹‹Canção da Jorna››) e Mário Dionísio (‹‹Canto de Esperança››, musicado por Fernando Lopes-Graça). Despediram-se com ‹‹Tiro-no-liro›› de José Mário Branco e ‹‹De não saber o que me espera›› de José Afonso.

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‹‹Dias impossíveis de contar. Não há tempo para isso. A multidão misturada com os soldados e marinheiros. Cravos (onde nasceram tantos cravos?) nas espingardas e nas mãos de toda a gente. Telefonemas, abraços, o “viva Portugal” por toda a parte. Um país diferente. Toda a gente fala com toda a gente, esfusiante, sem medo! A caça aos Pides. A libertação dos presos de Caxias, o regresso dos emigrados (Mário Soares, primeiro, Álvaro Cunhal depois, Piteira Santos virá depois, tantos mais).
Começam as reuniões por todo o lado. No Liceu Camões realizamos a primeira reunião de apoio ao Movimento. Vamos entregar à Junta de Salvação Nacional o nosso documento. Começamos a organizar-nos. Não paro mais. (30.4.74)››
Mário Dionísio, Passageiro Clandestino (inédito)

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Na Casa da Achada começava então a apresentação da exposição e de dois novos lançamentos: do livro-catálogo Mário Dionísio – Vida e Obra e do boletim Ficha 2. Eduarda Dionísio deu a primeira razão para ser nesse dia que se inaugurava esta exposição: o 25 de Abril cortou a meio, em duas metades ‹‹desiguais››, a vida de Mário Dionísio. E por isso vale a pena notar a ‹‹pobreza›› daquela zona entre 1974-1979: poucas fotografias (não havia tempo para isso), nem um livro (não havia vontade para isso). ‹‹Pobreza›› se compararmos com os seus 58 anos anteriores de luta contra o fascismo ou os 13/14 anos seguintes (painéis, vitrinas e tantos quadros nas paredes). A segunda razão por se ter escolhido esta data é a situação de hoje não ser muito diferente desta anotada por Mário Dionísio:

‹‹3.12.76
Comecei a evitar as palavras “democracia” e “democraticamente”. Acabarei talvez por riscá-las do meu vocabulário. Em todas as reuniões em que tenho participado, no liceu, verifico que o emprego dessas palavras é cada vez mais frequente por pessoas ineludivelmente reaccionárias, para as quais ainda há pouco tinham o diabo no corpo. Quando alguém se levanta e, em tom protestativo, clama “em qualquer assembleia democrática”, “isto assim não é democracia”, etc., digo para comigo: “já sei quem és”. Porque se trata de reivindicar na prática a adopção da alteração que pouco a pouco se tem dado no conceito de Democracia: regime em que a liberdade seja total para os que não querema liberdade e crescentes as restrições aos que sempre se bateram por ela. Democraticamente, devem deixar-se os seus lugares aos fascistas, por mais notórios que sejam, e permitir que se primam tão amplamente quanto o desejarem. Pelo contrário, deve-se manter a rédea curta a todos os que querem efectivamente transformar a sociedade, acabando com exploradores e explorados, o que seria evidentemente cortar a liberdade aos pobres dos exploradores, com tanto direito a existirem como aqueles que exploram…
É uma comédia sem dúvida, que se tinge de tragédia quando se verifica que a isto veio dar o 25 de Abril. Tenhamos, pelo menos, o cuidado de não participar nela, usando palavras que provocam, aumentam, generalizam despuridamente a confusão em curso, que só aproveita, como todas as confusões, aos pescadores de águas mais que turvas››
Mário Dionísio, Diário (inédito)

Esta exposição decorre dos estatutos da associação cultural Casa da Achada – Centro Mário Dionísio: divulgar a obra de Mário Dionísio. Também por isso foi concebida para ser itinerante. A sua concepção , execução e montagem não foi feita por técnicos, mas por pessoas que ‹‹prepararam e montaram esta exposição com os saberes e os prazeres que trouxeram das suas variadas artes e ciências, ofícios e militâncias, vidas e saberes. (E espero que tenham aprendido mais enquanto foram fazendo para poderem fazer outras coisas depois – aqui ou noutros lados.) – É para isto que serve a Casa da Achada››, disse Eduarda.

Mas talvez a maior razão para se ter inaugurado a exposição no 25 de Abril é por continuar a haver pessoas que gostam de estar umas com as outras nessa data.

No fim abriu-se o jardim ao público e começou o convívio com comes e bebes, continuaram os cantos, e muito se foi conversando e estando.

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Lembramos que no dia 30 de Abril, sábado, às 16h haverá uma visita guiada à exposição por Eduarda Dionísio.

Ver aqui as fotografias da actuação do coro e da inauguração.

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André Spencer e F. Pedro Oliveira para Casa da Achada - Centro Mário Dionísio | 2009-2020